Confecção dos afectos #3#
foto ff (Paris 2011)
Ficou em carne viva, sem pele que a cobrisse. No dia seguinte usou água da chuva para se lavar, alívio por instante, ardor constante; doía o ar, doía o movimento, doía olhar e ser olhada, doía articular, doía pensar, doía calar, doía esquecer, doía tocar, doía sentir. No mês seguinte quis vestir outro fato pré-fabricado, todo ele era demasiado algo, pequeno grande macio, duro, espesso, fino... No ano seguinte, e no seguinte, e no seguinte... continuava despida, com frio, fome e sede, ardia-lhe sorrir, era como arreganhar os dentes. Via lanugem e ficava de olho húmido, via braços fortes e rostos duros de luta com a terra e sentia que lhe fugiam para cada vez mais longe... tudo ficava numa terra distante, outra e outra e outra, ficou na ilha de si consigo mesma, como num Olimpo inócuo, como um Deus que é todos numa solidão de heterónimos, todos derreados, como pessoanos fracassados.
Etiquetas: no mundo dicotómico qual sou eu?
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