terça-feira, março 29, 2005

O apodrecer da vida

Confrange-nos a dor que alguém reflecte. Por pena de quem sofre. Por fraqueza nossa. Corrói-nos o vão esforço do Papa em balbuciar algumas palavras. Irrita-nos que o Vaticano o permita. Porque devíamos ser “poupados” de um espectáculo em que a decrepitude e a doença são figuras centrais? Porque a Igreja alheia à piedade quer mostrar um novo mártir, explorando a incapacidade de outrem? Será o próprio Papa que assim o quer? Se esta última hipótese for a correcta há que respeitar. Causa-nos algum incómodo mas não nos cabe condenar a exposição voluntária de alguém só porque nos mostra quão débeis, dependentes e decadentes podemos ser.

Terry Schiavo é mais nova. Muito mais nova, meia-morta há 15 anos e esperando (ou não) alheada, a morte que lhe há-de levar a metade podre que ainda lhe resta. A morte que se vai deixando manipular por aqueles que tomaram as rédeas da vida de Schiavo. De um lado a vida. Do outro, o fim do sofrimento. De um lado uma magra esperança. Do outro, finalmente, o luto. A decisão judicial foi em favor do pedido do marido de Terry e, portanto, da eutanásia passiva – retira-se o tubo através do qual ela se alimentava e espera-se que ela morra nos próximos dias ou nas próximas horas. Provavelmente, sofreria menos com uma injecção letal, mas não é permitido nem sabemos se seria essa a vontade de Terry.

1 Comentários:

Blogger trutasalmonada disse...

não sei se por sorte ou por azar o 'apodrecer por dentro', ao nível abstracto e mental, não é tão incapacitante materialmente para se decidir e concretizar a liberdade de viver.
fica a reflexão em aberto: será o suicídio a liberdade no seu auge ou a prisão na sua melhor performance?

4:35 da tarde  

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