segunda-feira, fevereiro 20, 2006

estado vígil


fotos de ff

A paisagem era linda! Havia flores amarelas, intercaladas com brancas, rosadas e aniladas, que abundavam salpicando o verdejante que dominava naquela longa extensão que o olhar alcançava.
Bem mais longe, nesse horizonte as árvores também se impunham com as suas flores viçosas e frutos brilhantes. Claro que alguns arbustos, munidos de espinhos, impunham cuidado e respeito redobrado para com a harmonia que ali figurava.
Alguns frutos apodrecidos traziam a lembrança do perene e dos obstáculos que nos acossam.
Algumas abelhas zuniam, umas vezes calmas e distantes, aludindo a um labor organizado, outras agitadas e demasiado próximas, numa azáfama estonteante e assustadora.
Os sons tanto eram de brisa perfumada, como de sons estridentes ou estranhos que apelavam ao desconhecido.
Isto fazia-a andar ‘à nora’, com pequenos período de usufruto da beleza que a rodeava, a que se sucedia uma angústia do desconhecido – como se esperasse ser surpreendida a qualquer momento, por uma 'pantera negra', ou qualquer outro animal que se avizinhasse perigoso, vindo do local menos esperado, do canto mais florido, das árvores mais apetitosas ou do arbusto mais viçoso.
Esta espera colocava-a num estado de vigília constante, incessante e desmotivante, pois não sabia de onde viria o perigo que tanto temia vir a pôr em perigo a sua pessoa.
Este estado levava-a a uma cansaço e exaustão que a prostravam para as coisas mais simples. Cada vez era mais difícil levantar-se, abrir os olhos, movimentar os maxilares, agitar as mãos, mover os pés. Os períodos em que corria sentindo o verdejante a beijar-lhe os calcanhares e o perfume a mordiscar-lhe as narinas, eram cada vez mais raros.
À vigília sucedia-se a exaustão e esta era cada vez mais dominante: de tanto vigiar, de tanto esperar de lugar incerto, levou o cérebro a não conseguir recompor-se no seu ciclo diário, a não conseguir articular o seu estado de vigília com o estado de relaxe e adormecimento tranquilo, deixando-a numa situação de necessidade de adormecimento profundo que lhe permitisse recomeçar de novo.
Estava ela neste estado quase a deixar-se tombar quando, de forma inesperada, viu um movimento sorrateiro daquilo que parecia o vislumbrar ameaçador de, talvez, uma 'pantera negra'.
Agora com um perigo concreto, definido e identificada a sua origem, todo o seu corpo se reactivou. Parecia uma máquina antiga, há muito desligada, a quem repuseram uma pequenina peça e, de repente, se reacende com luzes e piscar por todo o lado, ganhando vida, energia, actividade, impondo presença.
Os seus olhos tinham outro brilho, os seu lábios descerraram-se, a fácies deixou de estar descaída, os músculos retesaram-se e toda ela se preparou para enfrentar aquela ameaçadora, talvez, 'pantera negra'.
Estava possante e intimidante, mais parecia uma deusa a defender o seu Olimpo.

4 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Black & white : o meu colorido preferido em fotos, filmes, BD...gosto principalmente das três primeiras fotos às quais não pude deixar de associar um estado onírico...curioso tu falares de vigília...se os sonhos não são a cores, o ambiente deles deve ser parecido com este.

8:41 da manhã  
Blogger trutasalmonada disse...

By that we can have all the coulours of universe (at least mental universe)

4:00 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Engraçado quando, os olhos que te olham são tão mais tomográficos do que aquilo que esperamos. É algo assustador, enternecedor, mas sobretudo muito belo.
Engraçado quando o teu texto é tão concreto quando possível e docemente poético, eu uma vez mais...não entendo.
Por onde andam estes olhos e esta cabeça? Algures esquadrinhando paisagens em expectativa de panteras, tigres e outros felinos de silenciosa aproximação.
Que venham! Já não estou só.

12:19 da manhã  
Blogger trutasalmonada disse...

"Que venham! Já não estou só!"...é música muito bela para meus ouvidos, fico tão feliz por por te ouvir (lendo)...quantas novas paisagens podes esquadrinhar...quantos novos desafios se podes desejar...

8:28 da manhã  

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