domingo, maio 29, 2005

vi...sinto


Colin Farrel in "A Home At The End Of the World"

Vi “Uma Casa no Fim do Mundo” baseado na obra de Michael Cunningham.
Tenho emoções a passearem centrífuga e centrípetamente, alastram-se pela minha pela provocando arrepios gerais, vão da epiderme para a derme e da derme para a endoderme; apanham o tráfico dos globos vermelhos deixando-me ao rubro, com um calor inquietante; prosseguem até aos suportes esqueléticos, fazendo-me senti-los moles e quase quebradiços.
Ao longos desta viagem, nos dois sentidos, instalam-se nos meus centros nervosos, de onde partiram, quase fazendo-me desmaiar na intensidade de emoções activadas.
A sensação é de estar numa maratona de sentir a que não se pode faltar, de onde se saí exausto e não mais o mesmo.

Eu em diálogo com Eles


JUÍZO FINAL
Jesus preside o julgamento dos vivos e dos mortos (detalhe do tríptico O Juízo Final, de Hans Memling, 1472)

Eu em diálogo com Eles:

Eu - Adoro putas, admiro os mendigos, fascinam-me os ciganos, hipnotizam-me os padeiros, as costureiras, os carteiros, os jornaleiros, as mulheres 'a dias', seduzem-me os corpos em movimento, fantasio com os meus professores e outros que tais, divirto-me a jogar às escondidas com Deus...

Eles - Inclinação forte para o que é pecado, socialmente dúbio e legalmente condenável.

Eu - Vós dizeis que sim...

Eles - Rebeldia por oposição, necessitando de ser contra ao que está certo, por provocação e desafio. Tem alguma coisa a dizer em seu favor?

Eu - Sempre pensei que tudo se tratava da essência humana, na sua expressividade, coragem, humildade, dor, dedicação e humanidade. Obviamente merecedores de enorme respeito.

Eles - Diagnóstico confirmado, está mesmo fora da realidade, teremos de a sujeitar ao tratamento normalizante, para lhe libertarmos o corpo das tentações e salvarmos a alma dos horrores do inferno.

sábado, maio 28, 2005

dejá vú


Transparência LV, técnica mista sobre seda natural de MARIA CONCEIÇÃO VALDÁGUA

Nos conceitos de contemporaneidade a transparência é ordem...pena que só nas expressões artísticas, especialmente nos imóveis com grandes interesses mercantilistas: para facilitar a atenção, a apelo, o interesse e, por fim, o envolvimento em transacções de aquisição e posse.

Que falta este faz nas relações humanas, que apelos e interesses tão mais importantes se despoletariam, levando a investimentos de uns nos outros que nos arrancariam a este marasmo de nos escondermos, dos outros e de nós próprios.

Se eu vossa presidente (fosse do que fosse) transparência passava a ser palavra de ordem entre os humanos, desenvolveria mecanismos em que passaríamos a olhar as entranhas de cada um e, mais importante, a amá-las. Contrataria os cientistas mais conceituados para que descobrissem os mecanismos do amor universal e da partilha geral...de repente tive uma percepção dejá vú.

terça-feira, maio 24, 2005

Novas Cartas Portuguesas



algumas mulheres do mal também são das emoções, especialmente as três Marias:
Maria Isabel Barreno, 1938
Maria Teresa Horta, 1937
Maria Velho da Costa, 1938

partilhamos aqui algumas das pérolas com que nos brindam:

Intimidade

Lembra-te amor
de quando me despias:

os teus dedos correndo
lentamente:
lentamente afastavam e me abriam

12/1/71

in Novas Cartas Portuguesas

são estas as estrelas que nos guiam na direcção de outras estrelas, e assim consecutivamente...os sorrisos, olhares e trejeitos são como pó de pirilimpimpim que nos faz voar... porque acreditamos.

quinta-feira, maio 19, 2005

instante mágico


foto de gerardo suter

2ª feira, 9 horas. Deveria estar a sentar-me numa cadeira que todos os dias me aconchega as nádegas, para me prender aos compromissos laborais.
Afinal ainda estou em casa, numa bizarria fantástica (ainda que por momentos):
o telefone fixo, sem fios e electricidade-o-dependente, regista 00.00h do dia 1/1.
Fiquei hilariante, pensei que teria entrado na divisão tempo, de uma forma que o poderia manipular a meu jeito.
Eufórica pensei em telefonar rapidamente para mim mesma, para confirmar se estaria no estado em que me imaginava (num processo mnésico, ou fantasioso). Enfim poderia sonhar, através de uma reconstrução de memórias cuidadosamente selecionadas de forma aliciante, ou num processo de construção de realidade futura desejável a aprazível...num processo pseudo-sádico o telefone toca - alguém, numa voz irritantemente real, solicitava-me para um assunto relativo ao presente dia, que correspondia a uma concepção social, numa calendarização religioso-politica, de divisão e catalogação do tempo.
Assim iniciei mais um dia com a minha primeira frustração...mas com uma fantasia a bailar-me nos olhos.

quarta-feira, maio 18, 2005

Perdida

Vi-a de costas. A indumentária hoje era mais discreta. Justa e pequena mas massificada. Reconhecia pelos cabelos (mal) apanhados e andar errante. Abrandei o passo e deixei-me prosseguir o meu caminho atrás daquele ser perdido que procura nos rostos dos homens por quem passa, alguma reacção. Sem dar por isso, acelerei o passo e ultrapassei-a. Mas não a deixei para trás. Continuei a indagar sobre a vivência de alguém com olhar tão baço e só. Suponho que seja dada à exploração por aquele homem magro de bigode que fede a tabaco e a roupa ensebada. (é impressionante como umas montras a anunciar umas promoções primaveris nos mudam o rumo do pensamento!!). Entrei numa loja. Inopinadamente, notei alguma agitação entre as empregadas da loja. Comunicavam entre elas com acenos e olhares. Olhei na direcção dos olhos delas e vi-a. Vi agora o rosto que à pouco me escapou. O vermelho dos lábios contrastava com o cinzento do olhar, mas ambos estavam caídos. A tez macilenta. Mais macilenta que da última vez, embora encerrando, ainda, alguns traços de uma beleza que há muito se desvanece. Olhei novamente o desdém das empregadas. Suponho que, também, já a tenham visto. Afinal, é sempre naquela rua que a vejo.
Esqueceram-se de a tratar como potencial cliente.

segunda-feira, maio 16, 2005

auto-retrato


foto de ff

"A idéia de um auto-retrato é o artista interpretando a si mesmo. É exatamente isso, mas não se espere sempre a figura do artista em sua aparência e muito menos uma interpretação fotográfica que represente a realidade. (...)
Muitos artistas negaram-se a trabalhar tendo ele mesmo como tema, o que comprova mais ainda ser o auto-retrato um trabalho carregado com uma conotação diferente e única. Nós nos vemos sempre de uma forma diferente e peculiar. Já se disse que não adianta alguém nos falar a verdade sobre nós mesmos porque, de saída, não acreditamos.", por Ronaldo Carneiro Leão.

sexta-feira, maio 13, 2005

há dias assim...



...em que os olhares se cruzam escondendo a sua dor demasiado visível.

quarta-feira, maio 11, 2005

há dias assim...


foto de henning von gierke

...em que a melancolia se desnuda numa urgência solitária

quinta-feira, maio 05, 2005

Adoro os finais de tarde primaveris...
O chilrear dos pássaros entrou de surdina pela janela e subitamente, qual Alice no país das Maravilhas, instalei-me na poltrona do magnífico auditório da imaginação a ouvir a sinfonia dirigida pelo maestro Melro. Inesperadamente, berros de capa e batina interromperam os meus passarinhos de olhinhos postos no céu e biquinhos traulitantes. Pronto, entrámos mais uma vez na semana da histeria e da procura desenfreada de divertimento que apenas parece existir (para uma grande maioria) se for regado com litradas de álcool.
Embora o contexto (leia-se queima das fitas) não dignifique em nada o espectáculo, os Micro Áudio Waves são uma das propostas da Queima e valem MESMO a pena. Este outro projecto de Flac (Rádio Macau) ondula pela experimentalismo electrónico mas não esquece as influências do rock cujos riffs de guitarra pudemos constatar nas últimas músicas do segundo álbum – “No Waves”. O elemento feminino (inexistente no primeiro álbum, de nome “Micro Audio Waves”) surge-nos através da fantástica voz de Cláudia Ribeiro revelada por entre muitas das conjugações de letras soltas (Também existe texto com palavras reais. Em Inglês). Talvez não interesse mas, na minha opinião “No Waves” foi o melhor álbum português editado em 2004.
"A programação da janela era boa mas não podia mudar o canal."

(Daniel Q.)